Resenha

Queridos cineclubers,

A última floresta, que tem obtido muito reconhecimento no meio cinematográfico, mostra a realidade atual do povo Yanomami, uma realidade de crenças, coletividade, garimpo ilegal, doenças, costumes, violência, xapiris, rituais xamânicos com yakoana… muitas frentes de discussão pode ser abertas com base no documentário, mas uma que chama atenção é aquela acerca dos mitos — do papel que eles têm numa cultura, o que representam para cada povo e o que revelam sobre eles.


No desenrolar do filme, intercalando com cenas do cotidiano da aldeia Watoriki, o xamã Davi Kopenawa conta mitos yanomamis sobre o surgimento da humanidade, dos espíritos e dos males, que são protagonizados pelas figuras de Omama, Yoasi e Paonakare. Essas histórias, enquanto “relatos simbólicos, passados de geração em geração dentro de um grupo, que narram e explicam a origem de determinados fenômenos, seres vivos, instituições, costumes sociais" (definição do Oxford languages), estabelecem a moral, valores, ideologia e visão de mundo dos Yanomami. E não somente deles; o mesmo acontece com todo povo, porque todos os povos têm mitos, que narram, explicam, revelam, transmitem e fixam uma moral e criam uma identidade cultural coletiva.


No filme, o impacto dos mitos se vê na divergência de ideologia entre os brancos vindos das cidades e os indígenas: “para vocês que vivem na cidade, o mais importante é a mercadoria. Apesar de ter muitas mercadorias, o branco não divide. São sovinas. Fazer muitas mercadorias faz mal para a floresta. Para nós, importante são os animais da floresta, a fertilidade. Importe é dividir o alimento entre o nosso povo, nossa sobrevivência, nosso crescimento, nossa forma de viver e nossa existência como povo” (Davi Kopenawa Yanomami).


A última floresta é, de certo, uma obra singular sobre a qual há muito o que se discutir.